segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Podemos escolher amigos?

Já bate a primeira hora do dia. Uma da madrugada e cá estou escrevendo este texto. Noite quente esta aqui na capital. A cidade que nunca para nesse momento tira um cochilo pra encarar a segunda feira que se anuncia. Meu amigo Teixeirinha está no andar de baixo do beliche, refestelado na cama, roncando. É, o Teixeirinha ronca. Em alto volume, a noite inteira. Num compasso ora intenso, ora lento, feito um motor desregulado. Entre um solavanco e outro, meu amigo cruza a noite no seu merecido descanso; eu, à duras penas, vou me acostumando à situação.
Há quem diga que “amigos é a família que nos foi permitido ter”. Não sei ao certo de onde veio esta declaração, mas acho que o cara devia estar passando por uma crise de egocentrismo daquelas na hora que a proferiu. Ou por acaso você já escolheu algum amigo que hoje está aí do seu lado? Não escolhemos amigos como quem vai à feira e escolhe os melhores legumes para levar para casa. Amigo é amigo e ponto final. Se já criaram teorias que tentam explicar o fracasso ou o sucesso dos casamentos, dos relacionamentos profissionais ou familiares, ainda não vi nenhuma explicação convincente sobre o “nascimento” uma amizade entre duas pessoas. Podem até me falar de afinidades como gostos ou defeitos. Mas não sei se eles seriam os fatores preponderantes. Talvez sejam as sutis afinidades da alma que nos fazem amigo de alguém, que nos permitem participar da vida de outra pessoa nesse laço chamado amizade. É uma suave química, que se apresenta sem dar aviso, que a concebe. Pode durar a perpetuidade de uma vida inteira, ou ter a intensidade de uma amizade feita em uma viagem de ônibus.
Se existem amigos ou amizades perfeitas? Claro que não. Somos humanos, ora bolas! É sagrado direito o de sofrermos ou cometermos uma falha com um amigo. E é justamente para isso que humildade e sinceridade foram criadas. Para nos fazer perceber que somos falhos, e que nos sentimos mal por nossos atos. Amizade é exercício de humanidade, no sentido mais amplo da palavra. No fim das contas, por mais defeitos que aquele seu amigo tenha, é ele que nas horas mais difíceis está do outro lado do telefone agüentando suas chorumelas. Aquela sua amiga pode não ser lá muito “certinha”, mas é com ela que você se empanturra de chocolate quando o namorado dá uma mancada ou ainda, é aquela doida que te enche de coragem e faz você dançar com o bombeiro na sua despedida de solteira. Qual seria a graça das amizades se as pudéssemos escolher? Iríamos querer encontrar pessoas semelhantes a nós, que satisfizessem nossas vaidades, nossos pontos fracos.
Bem, já batem duas da manhã, melhor ir dormir. Quanto ao Teixeirinha? Ah, sim. Continua roncando. E continua sendo um bom amigo.

Este tal do politicamente correto

Bem, vamos com calma...
Deu o que falar na internet nestes tempos atrás um texto de autoria do Sr. Danilo Gentili, do programa “CQC” da Rede Bandeirantes de Televisão. No texto ele se utilizou de um termo, que não me cabe aqui julgamento, mas que para muitos foi considerado de teor racista. E então, fez o hecatombe.
Ficar discutindo aqui se o mérito da questão teve ou não um cunho racista poderia nos tomar horas de discussão que provavelmente não chegaria a uma conclusão contundente. É tudo uma questão de interpretação. Cada um absorve e interpreta uma informação de acordo com seus preceitos, de acordo com aquilo que lhe parece correto.
Fato: vivemos tempos do politicamente correto e, ao qualquer descuido, poderemos cair em maus lençóis ao dirigirmos determinada declaração. Evidente que isto não deve abrir o precedente para a banalização, para a superficialidade daquilo que escrevemos ou dizemos por aí. Respeito é bom e todo mundo gosta. Mas francamente não acredito que esta tenha sido a intenção do Sr. Danilo.
Não entendo a questão do racismo no Brasil. Parece existir por aqui certa “padronização” do que, quando, e onde se pode falar algo sobre alguém. Se um apresentador de televisão usa o termo “macaco” e o relaciona a uma loira, é racismo. Se chamo um amigo pelo apelido de Grafite, daí tudo bem. Se levarmos a ferro e fogo todo o tocante da questão, vamos então começar a prestar mais atenção naquilo que outras emissoras também dizem. Toda vez que a Globo, na transmissão do Carnaval, chamar o Neguinho da Beija-Flor por esta mesma alcunha, vamos também mandar calorosos e-mails à emissora platinada para que ela mantenha o politicamente correto. Já imaginou? “Agora o Luís Antônio Feliciano Marcondes vai puxar o samba enredo...” Ou então: “Lá vem o pequeno afro-descendente da Beija Flor, Luís Antônio Feliciano Marcondes, com o samba...” Esquisito né?
O que falta no nosso país são discussões sérias a respeito daquilo realmente importa para melhorar a vida da gente. Vamos nos sentir incomodados com este desrespeito, com esta falta de vergonha na cara daqueles que governam este país. Vamos nos sentir ofendidos com os impostos que a gente paga e que não vão para onde deveriam ir. Vamos nos sentir desrespeitados com esta lama que eu, você, todos nós engolimos dia após dia, vendo a educação pública do jeito que está, vendo o sistema de saúde do jeito que está. Vamos parar de nos esconder atrás de cortinas. Ainda existe desrespeito? Sim. Ainda existe este atraso de vida chamado racismo? Sim. Entretanto pertencemos a uma nação que permite o crescimento de vida à todos, pode acreditar.
Poderiam me permitir cinco minutos de franqueza? Vou insistir na opinião de que existem discussões de cunhos mais relevantes do que essa. É sempre bom lembrar que somos uma mistura de etnias. Vivo em uma cidade do interior de São Paulo, com grande influência italiana, há cerca de seis anos. E aqui enxergo um certo orgulho, um certo sentimento de diferenciação em algumas pessoas por conta disso. Para que? O respeito e a lembrança sobre a cultura vinda de nossos antepassados, aqueles que para cá vieram ajudar a construir esta nação devem sempre ser preservados. Mas, acima de tudo, somos brasileiros. Convivemos todos juntos, brancos, pretos, amarelos, azuis, laranjas e quantas cores mais você puder imaginar, todos debaixo do mesmo teto. Todos nesta mesma unidade chamada Brasil. E somente nosso próprio esforço, nosso trabalho duro, é que vai poder contribuir para termos um país cada vez melhor. Para todos.